A doença hepática gordurosa não alcoólica (DHGNA) é uma condição caracterizada pelo acúmulo de gordura no fígado, sem associação com o consumo excessivo de álcool. Estudos indicam que a prevalência global da DHGNA gira em torno de 25% da população mundial, podendo variar entre 20% e 40% dependendo da incidência de obesidade. A American Liver Foundation estima que aproximadamente 1 bilhão de pessoas sejam afetadas pela doença.
A DHGNA está diretamente relacionada a fatores metabólicos como obesidade, resistência à insulina e dislipidemia, sendo frequentemente observada em indivíduos com diabetes tipo 2 e síndrome metabólica. O aumento dos casos acompanha o crescimento das taxas de obesidade e doenças metabólicas em diversas regiões do mundo.
Sem tratamento adequado, a doença pode evoluir para esteato-hepatite não alcoólica (EHNA), um quadro inflamatório que pode levar à fibrose hepática, cirrose e carcinoma hepatocelular, aumentando significativamente o risco de complicações hepáticas graves.
O que é a doença hepática gordurosa não alcoólica?
A doença hepática gordurosa não alcoólica ocorre quando mais de 5% do peso hepático é composto por gordura, sem consumo significativo de álcool. Essa condição pode evoluir para esteato-hepatite não alcoólica (EHNA), uma forma inflamatória que pode resultar em fibrose, cirrose e até carcinoma hepatocelular.
A doença hepática gordurosa não alcoólica (DHGNA) está fortemente associada à síndrome metabólica, sendo frequente em indivíduos com diabetes tipo 2 e obesidade. Estima-se que entre 60% e 70% das pessoas com diabetes tipo 2 apresentem doença hepática esteatótica associada à disfunção metabólica (MASLD), segundo um estudo publicado no PubMed.
Diretrizes da EASL, EASD e EASO reforçam essa relação, destacando a importância do rastreamento e manejo adequado da DHGNA em indivíduos diabéticos. O aumento da resistência à insulina e o acúmulo de gordura hepática agravam o risco de complicações, tornando essa condição um ponto crítico no cuidado com a saúde metabólica.
Principais fatores de risco
A doença hepática gordurosa não alcoólica (DHGNA) é uma condição multifatorial, resultante da interação entre hábitos de vida, predisposição genética e condições metabólicas. Alguns fatores aumentam significativamente o risco de desenvolvimento e progressão da doença, tornando essencial o reconhecimento precoce para intervenções preventivas eficazes.
Obesidade e acúmulo de gordura visceral
O excesso de peso corporal, especialmente o acúmulo de gordura abdominal (gordura visceral), é um dos fatores mais relevantes para o desenvolvimento da DHGNA. Estudos indicam que mais de 90% dos pacientes com obesidade mórbida apresentam algum grau de esteatose hepática. A obesidade central está associada ao aumento da resistência à insulina e à inflamação crônica de baixo grau, favorecendo o acúmulo de lipídios no fígado.
Diabetes tipo 2 e resistência à insulina
A resistência à insulina desempenha um papel central na patogênese da DHGNA. Dados da literatura sugerem que entre 60% e 70% dos indivíduos com diabetes tipo 2 apresentam algum grau de acúmulo de gordura no fígado. A hiperglicemia crônica e a resistência à insulina promovem um aumento na produção hepática de lipídios, acelerando a progressão da doença para quadros mais graves, como a esteato-hepatite não alcoólica (EHNA).
Dieta rica em ultraprocessados e gorduras saturadas
A alimentação tem um impacto direto na saúde hepática. Dietas ricas em açúcares refinados, frutose, gorduras saturadas e alimentos ultraprocessados aumentam significativamente o risco de DHGNA. O consumo excessivo desses alimentos está associado à diminuição da sensibilidade à insulina e ao aumento da deposição de gordura no fígado. A ingestão de bebidas adoçadas com frutose, por exemplo, tem sido fortemente correlacionada com o aumento da esteatose hepática.
Sedentarismo e baixa atividade física
A falta de atividade física regular contribui para o desenvolvimento da DHGNA, pois reduz a oxidação de ácidos graxos no fígado e favorece o acúmulo de lipídios. Estudos indicam que o sedentarismo pode levar a um aumento de até 45% no risco de desenvolver esteatose hepática, mesmo em indivíduos sem obesidade. A prática regular de exercícios aeróbicos e de resistência ajuda a melhorar a sensibilidade à insulina e a reduzir o acúmulo de gordura hepática.
Dislipidemia e desregulação do metabolismo lipídico
A dislipidemia, caracterizada por níveis elevados de triglicerídeos e colesterol LDL (lipoproteína de baixa densidade), contribui para o aumento da lipogênese hepática. O fígado se torna incapaz de metabolizar adequadamente os ácidos graxos, promovendo a deposição de gordura e agravando o quadro inflamatório. Indivíduos com síndrome metabólica frequentemente apresentam perfis lipídicos alterados, aumentando o risco de progressão da DHGNA.
Hipertensão arterial e inflamação crônica
A hipertensão arterial sistêmica está associada ao aumento da inflamação hepática e do estresse oxidativo, contribuindo para o agravamento da DHGNA. A hipertensão metabólica, comum em indivíduos com resistência à insulina, pode acelerar a progressão para fibrose e cirrose hepática. A regulação da pressão arterial por meio de mudanças no estilo de vida e, quando necessário, com uso de medicação, pode reduzir o risco de complicações hepáticas.
A presença desses fatores pode acelerar a evolução da doença hepática gordurosa não alcoólica, tornando importante a adoção de estratégias preventivas que envolvem mudanças no estilo de vida, monitoramento metabólico e acompanhamento médico regular.
Sintomas e diagnóstico
A doença hepática gordurosa é assintomática em grande parte dos casos, sendo identificada, muitas vezes, por exames de imagem de rotina. Alguns pacientes podem apresentar fadiga, desconforto abdominal no lado direito e hepatomegalia.
Os principais exames utilizados no diagnóstico incluem:
- Ultrassonografia abdominal: método não invasivo para identificar gordura no fígado.
- Elastografia hepática: avalia a presença de fibrose.
- Exames laboratoriais: níveis elevados de ALT e AST podem sugerir inflamação hepática.
- Ressonância magnética com espectroscopia: análise detalhada do conteúdo lipídico hepático.
Estratégias de prevenção
A prevenção da doença hepática gordurosa está diretamente relacionada a mudanças no estilo de vida, incluindo alimentação equilibrada, atividade física regular e controle de fatores metabólicos.
Alimentação adequada
A escolha dos alimentos tem impacto direto na saúde do fígado. Estudos indicam que padrões alimentares ricos em gorduras saudáveis, fibras e antioxidantes contribuem para a redução da gordura hepática e melhora da sensibilidade à insulina. Alguns alimentos benéficos incluem:
- Óleos vegetais prensados a frio: fontes de ácidos graxos monoinsaturados.
- Peixes de águas frias: ricos em ômega-3, auxiliam na redução da inflamação hepática.
- Cereais integrais: favorecem o equilíbrio glicêmico e a função metabólica.
- Frutas e vegetais variados: fontes naturais de antioxidantes e compostos bioativos.
- Oleaginosas e sementes: fornecem gorduras saudáveis e ajudam no controle do colesterol.
Manter um padrão alimentar equilibrado, evitando ultraprocessados, excesso de açúcares e gorduras saturadas, pode contribuir para a prevenção da doença hepática gordurosa não alcoólica e suas complicações.
Exercício físico
A prática regular de exercícios físicos tem efeito positivo na redução da gordura hepática e na melhora da resistência à insulina. Estudos indicam que:
- Exercícios aeróbicos, como caminhada e corrida, ajudam na oxidação de ácidos graxos hepáticos.
- Treinamento de força melhora a composição corporal e reduz o acúmulo de gordura no fígado.
- Sessões curtas e intensas podem ser tão eficazes quanto atividades prolongadas.
A recomendação geral da American Association for the Study of Liver Diseases (AASLD) é de pelo menos 150 minutos de atividade física moderada por semana.
Controle de fatores metabólicos
Manter o peso adequado e controlar condições como diabetes, hipertensão e dislipidemia são medidas essenciais para evitar a progressão da doença hepática gordurosa. Estratégias incluem:
- Monitoramento regular da glicemia para evitar resistência à insulina.
- Redução da ingestão de álcool, mesmo em níveis moderados.
- Uso de medicamentos hipolipemiantes, quando indicados pelo médico.
Tratamentos e perspectivas futuras
Atualmente, não existe um tratamento medicamentoso aprovado especificamente para a doença hepática gordurosa não alcoólica (DHGNA). O manejo clínico da doença baseia-se, principalmente, em mudanças no estilo de vida, como adoção de uma dieta equilibrada e prática regular de exercícios físicos. A perda de peso demonstrou ser a estratégia mais eficaz para a redução da gordura hepática e da inflamação, com estudos apontando que uma redução de 7% a 10% do peso corporal pode melhorar significativamente o quadro da DHGNA.
Terapias em investigação
Nos últimos anos, diversas abordagens farmacológicas vêm sendo estudadas para o tratamento da DHGNA, com destaque para medicamentos já utilizados no manejo do diabetes tipo 2 e obesidade, como:
- Agonistas do GLP-1 (exemplo: liraglutida e semaglutida) → Demonstraram eficácia na redução da gordura hepática, resistência à insulina e inflamação. Estudos indicam que esses medicamentos podem reduzir significativamente a progressão da DHGNA para quadros mais graves, como fibrose e cirrose.
- Inibidores de SGLT-2 (exemplo: empagliflozina e dapagliflozina) → Usados no tratamento do diabetes, esses medicamentos têm mostrado efeitos positivos na redução do acúmulo de gordura no fígado e melhora do perfil metabólico.
- Agonistas do PPARs (peroxisome proliferator-activated receptors) → Substâncias como pioglitazona e elafibranor demonstram potencial para reduzir a inflamação hepática e melhorar a sensibilidade à insulina.
Além desses, outras terapias em desenvolvimento incluem moduladores do metabolismo lipídico, antifibróticos e anti-inflamatórios hepáticos, que ainda estão em fase de ensaios clínicos.
Avanços na medicina personalizada
A identificação de biomarcadores hepáticos e genéticos pode permitir um diagnóstico mais precoce da doença hepática gordurosa e auxiliar na personalização dos tratamentos. Testes de biomarcadores sanguíneos, como NIS4, FIB-4 e ELF, vêm sendo utilizados para identificar fibrose hepática e avaliar a progressão da doença sem a necessidade de biópsia.
Além disso, o avanço na inteligência artificial e no aprendizado de máquina tem permitido a criação de algoritmos capazes de prever a progressão da DHGNA e personalizar terapias com base no perfil metabólico do paciente.
Futuro do tratamento da DHGNA
A combinação de terapias farmacológicas, mudanças no estilo de vida e monitoramento metabólico personalizado promete transformar o tratamento da DHGNA nos próximos anos. O desenvolvimento de medicamentos específicos para reduzir a gordura hepática e controlar a inflamação pode representar um avanço significativo para evitar a progressão da doença para estágios mais graves, como fibrose, cirrose e carcinoma hepatocelular.
Até que um tratamento específico seja aprovado, a intervenção precoce e a adoção de hábitos saudáveis permanecem como as melhores estratégias para reduzir o impacto da doença hepática gordurosa não alcoólica na saúde global.